Era uma vez na Copa...

quarta-feira, 23 de julho de 2014

Sobre um atentado ao direito de greve e uma violência aos servidores da USP




Por Jorge Luiz Souto Maior

A Circular 12/2014 da CODAGE (Coordenadoria de Administração Geral) da USP constitui um atentado ao direito de greve e uma violência aos servidores da USP.
O ato, aparentemente baseado em pressupostos jurídicos, apresentados em tese, tem, na verdade, o propósito de ameaçar os trabalhadores em greve, impondo-lhes um sentimento de medo.
A Coordenadoria tenta escorar-se na legalidade, mas lida com o ordenamento jurídico de forma conveniente, pinçando apenas os aspectos que lhe interessa. Neste contexto, finge esquecer que a greve dos servidores, que é um direito fundamental, constitucionalmente assegurado, teve início porque a Administração da Universidade não cumpriu o preceito da Constituição Federal que garante aos servidores púbicos o direito à “revisão geral anual”, destinada à recomposição do poder aquisitivo da remuneração (art. 37, inciso X).
A Administração da Universidade tenta fazer crer que não pode dar o reajuste porque o percentual máximo destinado aos gastos com pessoal já foi ultrapassado, como se o autor do ilícito pudesse ser beneficiado pela própria torpeza. Ora, a Administração da Universidade destinou verbas para várias finalidades indevidas e é completamente imprópria a discussão a respeito de quem, pessoalmente, foi o responsável por isso. A USP não é o reitor ou os membros do Conselho Universitário. Se houve gasto indevido a instituição deve arcar com os efeitos dessa situação, buscando, pela vias legais, a condenação pessoal dos eventuais responsáveis. O que não cabe é deixar de buscar essa responsabilização e ao mesmo tempo punir os trabalhadores, que nada tiveram com o ilícito praticado.
E os equívocos administrativos na seara do orçamento são muitos, englobando, também, a própria falta de discussão a respeito da base de cálculo do orçamento, sobretudo em razão da expansão mal programada da Universidade, havida nos últimos anos.
Em suma, a Universidade está em plena ilegalidade frente aos seus compromissos salariais com servidores e professores e tenta fazer crer que os trabalhadores em greve é que estão cometendo alguma ilegalidade.
Mas que fique bastante claro: do ponto de vista estritamente jurídico, os trabalhadores (servidores e professores) não estão em greve por melhores condições de trabalho. De fato, estão em greve como forma de resistir à ilegalidade cometida pela Universidade, tentando, pela ação política (autorizada por lei), recompor a autoridade da ordem constitucional.
Lembre-se que a ilegalidade da Administração ainda se torna maior quando esta se recusa a implementar uma negociação efetiva com as categorias em greve.
Na realidade vivenciada na USP é inconcebível sequer sugerir que a greve de servidores e professores (com apoio essencial dos estudantes) seja ilegal ou abusiva e tanto a Administração da Universidade sabe disso que até hoje, passados 57 (cinquenta e sete) dias, não se predispôs a entrar com ação na Justiça para interromper a greve por decisão judicial.
E artificializar a situação fez tão mal à Administração da Universidade que esta acabou aprofundando-se na ilegalidade ao tentar “massacrar” aqueles que deveria tratar como a essência da instituição (os servidores e professores), mas que passou a considerar como adversários a serem abatidos.
Em meio ao contexto das ilegalidades cometidas, a Administração da Universidade viu-se legitimada a invocar a Lei n. 7.783/89 para ameaçar os servidores com o corte de salário e para chamar de “ímprobos”, ou seja, desonestos, os trabalhadores que registram seu comparecimento ao local de trabalho, mas que não trabalham.
Ora, a Lei n. 7.783/89, que em muita medida já é restritiva do direito constitucional de greve, deve ser aplicada por inteiro e não seletivamente, devendo ser considera, também, a experiência jurisprudencial que lhe diz respeito.
Do ponto de vista concreto, somente há desconto de salário na greve quando esta é considerada ilegal ou abusiva. Do contrário, a jurisprudência trabalhista jamais recusa aos trabalhadores em greve considerada legal o direito ao salário.
Conforme Ementa, da lavra do Dr. Rafael da Silva Marques, aprovada no Congresso Nacional de Magistrados Trabalhistas, realizado em abril/maio de 2010: não são permitidos os descontos dos dias parados no caso de greve, salvo quando ela é declarada ilegal. A expressão suspender, existente no artigo 7º. da lei 7.783/89, em razão do que preceitua o artigo 9º. da CF/88, deve ser entendida como interromper,  sob pena de inconstitucionalidade, pela limitação de um direito fundamental não-autorizada pela Constituição federal”.
Ora, se a greve é um direito fundamental não se pode conceber que o seu exercício implique o sacrifício de outro direito fundamental, o da própria sobrevivência. Lembrando-se que a greve traduz a própria experiência democrática da sociedade capitalista, não se apresenta honesto impor um sofrimento aos trabalhadores que lutam por todos, que, direta ou indiretamente, se beneficiam dos efeitos da greve.
Para negar aos trabalhadores o direito ao recebimento de salário no período em que exercem o direito de greve escora-se em previsão contida na Lei n. 7.789/89, que assim dispõe:
“Artigo 7º - Observadas as condições previstas nesta Lei, a participação em greve suspende o contrato de trabalho, devendo as relações obrigacionais, durante o período, ser regidas pelo acordo, convenção, laudo arbitral ou decisão da Justiça do Trabalho.”
Imagina-se que este dispositivo tenha retirado dos trabalhadores o direito de recebimento de salário durante o período da greve, mas de fato, vale reparar, não há disposição expressa neste sentido. Aliás, nem poderia ser diferente porque a perda do salário só se justifica em caso de falta não justificada ao trabalho e é mais que evidente que a falta de trabalho, decorrente do exercício do direito de greve, está mais que justificada, afinal a greve é um direito do trabalhador.
Quando o trabalhador está exercendo o direito de greve sequer se pode falar em “falta ao trabalho”, vez que a greve pressupõe ausência de trabalho e não ausência ao trabalho. Os trabalhadores em greve comparecem ao local de trabalho, para fazerem suas manifestações e reivindicações.
Neste sentido, aliás, fazer constar a presença nos registros de freqüência não é desonestidade alguma, até porque há várias modalidades de greve, dentre elas, por exemplo, a conhecida “operação tartaruga”. O trabalhador em greve, idealmente, deve comparecer ao local de trabalho e não trabalhar e se comparece pode, e deve, registrar sua presença, pois a greve, legalmente falando, é ausência de trabalho e não fuga do local de trabalho.
É interessante perceber que em alguns locais de trabalho a experiência humana, dos pontos de vista cultural, acadêmico, político e democrático, é muito mais intensa nos períodos de greve, quando se deixa de lado o trabalho burocratizado, mecanizado, e se estabelece um debate aberto sobre a própria estrutura na qual o trabalho se insere.
Tratando, ainda, da questão jurídico-formal, cumpre acrescentar que na lei não há diferença entre interrupção e suspensão do contrato de trabalho, embora a doutrina tenha criado essa diferenciação em razão da expressão trazida como denominação do Capítulo IV da CLT: “Da Suspensão e da Interrupção”.
O fato é que embora o nome do Capítulo seja o acima aludido, a própria CLT não definiu as figuras em questão. Por esforço classificatório, a doutrina nacional tratou de separar as hipóteses. Mas, sem o pressuposto de uma definição legal, formou-se na doutrina uma divergência a respeito do assunto, pois para alguns a suspensão seria caracterizada pela ausência total de efeitos jurídicos[1] enquanto que para outros a produção de alguns efeitos não a descaracterizaria[2]. Para estes últimos, o elemento diferenciador seria apenas o recebimento, ou não, do salário, com a conseqüente contagem do tempo de serviço.
Na verdade, a discussão acadêmica acerca do melhor critério para separar interrupção e suspensão tem pouca ou nenhuma importância, pois os efeitos jurídicos atribuídos a cada situação devem ser determinados na lei.
Assim, quando a Lei n. 7.783/89 traz a expressão suspensão não se pode atribuir a ela os efeitos jurídicos postos por uma classificação de caráter doutrinário, que sequer se apresenta de forma unânime.
O que importa, unicamente, é saber o que a lei considera suspensão da relação de emprego e quais efeitos jurídicos são por ela, a lei, mantidos vigentes durante o período correspondente, sabendo-se que o efeito da manutenção da relação de emprego está sempre presente.
Neste aspecto não pode haver dúvida de que a Lei n. 7.783/89, em nenhum momento, autorizou o desconto dos salários no período da greve. O que diz a Lei é: “...devendo as relações obrigacionais, durante o período, ser regidas pelo acordo, convenção, laudo arbitral ou decisão da Justiça do Trabalho.” – grifou-se
Ora, o que se estabelece é que os efeitos obrigacionais não estão fixados pela lei. Assim, não pode o empregador, unilateralmente, dizer que está desobrigado de pagar salários durante a greve, pois não terá base legal nenhuma a embasá-lo.
E, como se está procurando demonstrar, o direito do recebimento de salário é um efeito obrigacional inegável na medida em que, por lei, o não recebimento de salário somente decorre de falta injustificada ao serviço, ao que, por óbvio, não se equipara a ausência de trabalho em virtude do exercício do direito de greve. É evidente que o exercício de um direito fundamental, o da greve, não pode significar o sacrifício de outro direito fundamental, o do recebimento de salário.
A interpretação extensiva dos termos da lei, implicando na negativa ao direito de recebimento de salários, é imprópria mesmo sob o prisma das técnicas de interpretação do direito comum, quando mais em se tratando de um direito social. É evidente que a preocupação do legislador, ao dizer que a greve “suspende o contrato de trabalho”, foi a de dar ênfase à preservação da relação de emprego, evitando que o empregador considerasse os dias parados como faltas ao trabalho e propugnasse pela cessação dos vínculos jurídicos. É o que consta, ademais, com todas as letras no parágrafo único do artigo 7º., da lei em questão: “É vedada a rescisão de contrato de trabalho durante a greve, bem como a contratação de trabalhadores substitutos, exceto na ocorrência das hipóteses previstas nos artigos 9º e 14.”
Lembre-se que as ameaças econômicas, como represálias à adesão a atividades sindicais – e a greve é a principal delas – para intimidar e gerar medo nos trabalhadores, constituem atos antissindicais, tais como definidos na Convenção 98 da OIT (ratificada pelo Brasil, em 1952), que justificam, até, a apresentação de queixa junto ao Comitê de Liberdade Sindical da referida Organização.
Em suma, ainda que em tese se pudesse sustentar que a greve suspende os contratos de trabalho, gerando o não pagamento de salários, não se aplicaria tal interpretação jurídica ao caso concreto vivenciado na greve da USP, ainda mais porque a manutenção dos salários está integrada ao patrimônio jurídico dos servidores como efeito do direito consuetudinário. Lembrando-se também que o direito não existe em abstrato, vale reparar que o argumento a favor do desconto dos salários no contexto atual serve unicamente para causar mal estar aos trabalhadores que, sabidamente, estão integrados a uma greve legal, que mesmo sob a lógica da posição assumida pela Universidade não geraria esse efeito, ainda que a greve fosse judicializada. Ademais, nenhum direito pode ser exercido com o propósito exclusivo de causar sofrimento ao outro, ainda mais quando se pretende por esse sofrimento persuadir o cidadão a abrir mão de um bem, constitucionalmente assegurado como um direito fundamental.
Esperava-se que Universidade assumisse o grave problema da ausência de reajuste salarial que a má administração gerou aos trabalhadores, que são, como deveria saber, a essência da instituição, e que buscasse os meios necessários para solucionar a questão, negociando de forma clara e direta com as categorias em greve, e não que tentasse mascarar os próprios erros, jogando sobre os ombros dos trabalhadores o peso de uma pretensa ilegalidade, avaliada a partir de uma visão seletiva e conveniente do ordenamento jurídico, e que cometesse, ainda, o despropósito de violentar os trabalhadores com a acusação rasteira e desrespeitosa da desonestidade.
Não sendo assim, o mínimo que se pode aguardar no presente momento, para que a crise não se instaure de forma incontornável na Universidade, é que a Coordenadoria de Administração Geral tenha a grandeza de rever seu posicionamento.


[1]. SÜSSEKIND, Arnaldo e outros. Instituições de Direito do Trabalho. 21ª ed. Vol. 1. São Paulo: Ltr, 2003, p. 281 e 301.
[2]. CATHARINO, José Martins. Contrato de emprego: comentários aos arts. 442/510 da CLT. 2a ed. Rio de Janeiro: Edições trabalhistas, 1965, p. 242; DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo: LTr. 2002. p. 1032.

segunda-feira, 14 de julho de 2014

Moral da Copa: a fantasia clama pela racionalidade




  
Por Jorge Luiz Souto Maior
Peço desculpas pelo tamanho do texto, mas a complexidade do contexto em que vivemos exige que as ideias sejam apresentadas por inteiro, ainda que de forma resumida.
O que pretendo com este ensaio, que nesta visão mostra-se até bastante pequeno, é, sobretudo, advertir sobre os problemas que decorrem da perda da racionalidade, o que não significa dizer que as posições aqui assumidas sejam as corretas. Penso que o único erro que se pode cometer é o de evitar as análises sob o pressuposto de que qualquer tipo de problematização seja uma forma de derrotismo ou de conspiração.
A ocorrência da Copa e o advento das eleições estão obstando a realização de análises comprometidas apenas com os fatos, tais como se apresentam, e isso tem gerado um definhamento na capacidade crítica e reflexiva. As pessoas não querem ouvir e têm medo de falar.
O que proponho, portanto, é apenas que retomemos o diálogo franco e aberto sobre os problemas sociais do país, passando por cima de interesses estritamente eleitorais, estabelecidos em lógica maniqueísta, e de propósitos comerciais.
Nessa perspectiva é que lhes convido a perder parte do valioso tempo de suas vidas com a presente leitura.
1. “Toca de tatu”[1]
Em entrevista após o 7 a 1 contra Alemanha, Neymar, refutando algumas críticas à seleção brasileira, falou que “é muito fácil falar depois que as coisas acontecem”...
Entendo o que o craque e cidadão Neymar disse. Pretendeu explicitar que antes da partida ninguém diria que aquele resultado ocorreria e mesmo os críticos não manifestariam uma visão tão negativa da seleção quanto a que os gols da Alemanha lhes permitiram expressar. Além disso, após um resultado acachapante como aquele passou a ser muito fácil para os críticos apontarem problemas e mais problemas sem receio de objeções, em razão do dado objetivo, irrespondível, da goleada sofrida pela seleção.
Mas se há alguma verdade na justa observação de Neymar, não é possível deixar de reconhecer que também fica muito fácil recusar as críticas a partir desse argumento, incorrendo-se em erro ainda mais grave que é o de fingir que o resultado não ocorreu, como se verificou, posteriormente, na postura da comissão técnica da seleção brasileira.
Claro que diante de um 7 a 1 é preciso mesmo muito cuidado para fazer a crítica, como adverte Juca Kfouri, para não perder a mão e sair por aí destruindo moralmente as pessoas.
Creio que os jogadores fizeram a sua parte. Jogaram o que podiam, sobretudo diante da carga emocional que indevidamente recaiu sobre suas cabeças. A comissão técnica trabalhou de forma intensa e, por óbvio, fez o trabalho que considerava ser o melhor que podia fazer. Em suma, é preciso respeitar os profissionais que atuaram na seleção, vendo-os como trabalhadores, ainda que muitos deles não se vejam como tal.
Muito menos se pode dizer, a partir do 7 a 1, que a Copa em si não teve muitos pontos positivos tanto no aspecto da qualidade dos jogos quanto no que tange à organização.
Mas daí a dizer, como disseram os membros da comissão técnica, que o 7 a 1 foi fruto de um apagão de 6 minutos e que não tem uma explicação, tendo sido meramente obra da magia do futebol, negando-se a reconhecer algum erro na formação e no treinamento da seleção, vai uma distância muito grande, que alimenta uma atitude dissimulada, em desprezo pleno da realidade.
Essa atitude, ademais, de negar as evidências, foi a que proporcionou que a seleção cometesse os mesmos erros no jogo contra a Holanda, promovendo novo resultado negativo, nem tanto pelo número de gols, mas pela própria forma equivocada de atuação.
Portanto, bem ao contrário do que a frase do Neymar, literalmente interpretada, sugere, não é nada fácil falar sobre a performance da seleção brasileira na Copa depois dos fatos ocorridos, até porque há vários riscos envolvidos ao se entrar no pêndulo impreciso entre a dramatização e a banalização.
2. “Diz um diz que viu”
Sei que, em tese, é só futebol. Sei também que se trata de um esporte cuja dinâmica permite que os resultados possam não ser aqueles que se imaginava devessem racionalmente ocorrer. Mas quem transformou a Copa em algo mais representativo que o próprio jogo não fui eu. De fato, criou-se uma fantasia em torno da Copa, que fora tomada como instrumento para abafar a contestação política ao governo. E agora que o time dentro de campo não funcionou não é mais possível vir a público para dizer que é “só futebol”.
Vale lembrar que a influência política, apoiada no apelo de uma comoção midiática, proporcionou uma preparação da seleção para a Copa completamente alheia a uma avaliação crítica mais contundente. A seleção se formou a partir de uma espécie de consenso, sem ser de fato testada, tudo a partir do argumento objetivo de ter se sagrado campeã da Copa das Confederações, evento que se realizou no olho do furacão das manifestações de junho de 2013 e cujo título serviu para criar o artifício de uma coesa contraposição patriótica à contestação política.
E lá foi a seleção, “que nem marquês de Pombal”, blindada com a marca de salvadora da pátria. Isso já ia mal!
Envolvida na própria fantasia criada, que se alimentava da comoção de entoar o “hino a capella”, que rapidamente foi assimilada como uma marca da seleção, a comissão técnica se viu na contingência de ter que manter os jogadores que participaram daquele torneio, um torneio que, todos sabem, não tem um valor efetivo. Mas, enfim, a fantasia já estava arraigada aos corações e mentes de todos. Resultado: chegou-se à Copa do Mundo com uma seleção com deficiência técnica no conjunto, sem estrutura de jogo e sem opções para reagir diante de adversidades criadas por rivais preparados sem esse fardo.
Com raras exceções, como, por exemplo, a do craque Neto, que reiteradamente insistia em dizer que o Luis Fabiano deveria ser o reserva do Fred, foram pouquíssimas as vozes dissonantes com relação à convocação.
Sem a influência da fantasia seria óbvio perceber que o Neymar não poderia ser o líder da equipe e que faltava alguém – um menos “bom moço” – que assumisse a responsabilidade em campo de arrumar o time e outros que pudessem dividir com o Neymar o peso de decidir os jogos. Não se está dizendo que jogadores com essas características existiam e cobrando nomes. Mas a mera ausência já exigia uma preparação diferente.
Claro que neste aspecto a crítica de Neymar, inicialmente reproduzida, toma corpo, exatamente no sentido de que agora fica fácil falar isso... Mas o que estou pontuando não é qual a convocação deveria ter sido feita e sim que a fantasia criada em torno da Copa das Confederações impediu que se pudesse ter visto as deficiências, no conjunto, do time, indo, aliás, muito além disso, pois a conquista chegou a conferir aos jogadores o excessivo patamar de “pop stars”, o que, claro, foi incentivado por patrocinadores, como forma de alavancar negócios.
3. “Um pega lá no toma-lá-dá-cá”
Consciente de que tinha nas mãos a equipe talhada para ser campeã, na perspectiva do governo o que restava era apenas garantir que a Copa ocorresse sem transtornos, pois o título viria como a cereja do bolo que anularia qualquer crítica à realização do evento.
As manifestações de junho foram violentamente rechaçadas em nome da Copa das Confederações e o sucesso atingido conferiu o direcionamento: impedir que as contestações populares ao evento tivessem lugar. E se visualizou a “Copa das tropas”.
A fantasia já criada em torno da seleção foi transportada para o campo administrativo e político. A Lei Geral da Copa estabeleceu um Estado de Exceção na ordem constitucional brasileira, mas a população foi levada a crer que isso de fato não ocorria e que todos os que apresentavam argumentos com alguma racionalidade objetiva estavam apenas tentando inviabilizar o evento e querendo abalar a estabilidade política do governo.
Por mais que estivessem claros os absurdos jurídicos cometidos na preparação para a Copa com: a) as remoções de famílias; b) a criação de um “local oficial de competição” reservado à FIFA e suas parceiras para comercialização exclusiva; c) a institucionalização do trabalho voluntário na realização de serviços ligados a um empreendimento econômico; d) o permissivo da exploração do trabalho infantil nas atividades ligadas aos jogos, incluindo a de gandula; e) a liberdade conferida à FIFA para atuar no mercado, sem qualquer intervenção do Estado, podendo, inclusive, fixar o preço dos ingressos como bem lhe aprouvesse e mesmo assim a entidade ainda se viu envolvida na formação de um mercado paralelo de ingressos; f) a eliminação do direito à meia-entrada; g) o afastamento da aplicação do Código de Defesa do Consumidor; h) a ausência de fiscalização efetiva das condições de trabalho nas obras dos estádios, das quais decorreram oito mortes e inúmeros acidentes (não contabilizados); i) a isenção tributária à FIFA; j) a restrição à atividade dos ambulantes; l) o incentivo à formação de relações de trabalho por intermédio da terceirização; a fantasia falava cada vez mais alto.
Assim, para atender o compromisso de realizar aquela que se passou a anunciar como a “Copa das Copas” e permitir a curtição do futebol nos estádios, no Fan Fest, em bares, no sofá da sala ou no churrasco com amigos, regado a muita “birita”, era preciso difundir a ideia de que nenhum problema de fato estava ocorrendo, fazendo acreditar que ser brasileiro era necessariamente torcer para a seleção e que tudo o mais não importava naquele momento, impulsionando, desse modo, um espírito de massa, próprio aos regimes totalitários, que se legitimam no Estado de Exceção.
A fantasia em favor da comoção e do ópio tinha, ainda, que desqualificar todos que falavam dos problemas da Copa, mesmo que apenas quisessem, como ocorria a muitos, firmar sua posição quanto à impropriedade de se ter destinado dinheiro público para realizar a Copa exatamente no momento em que a população tinha ido às ruas para pleitear melhorias nos serviços públicos ligados aos direitos sociais e no que se refere aos riscos a que se submetia toda a população com a abertura às práticas policialescas e de supressão de direitos democráticos, notabilizando-se o prejuízo histórico à classe trabalhadora.
Na perspectiva das manifestações populares, essa “derrota” foi imposta pelo uso da força policial, promovendo-se um grave retrocesso na forma democrática de encarar as mobilizações, isso se tomarmos como referência o padrão atingido em junho de 2013. Chegou-se mesmo a estabelecer uma associação entre a União e os diversos Estados da Federação, independente de filiação partidária, para instituição de uma “política federativa de segurança”, conforme assumiu a Presidenta Dilma[2]. Tudo para abafar as mobilizações populares, tendo se chegado ao ponto da total supressão do direito de manifestação e de reunião, como se deu no primeiro dia da Copa em São Paulo, quando uma manifestação foi impedida de iniciar, e no dia 1º. de julho, em ato realizado, também em São Paulo, na Praça Roosevelt, que restou sitiada por um contingente de policiais no mínimo três vezes superior ao número de participantes. A repressão foi acompanhada da tática de criminalização, que vitimou em São Paulo, os estudantes Murilo Magalhães e Fábio Hideki Harano e o professor Rafael Marques, estes últimos dois presos desde o dia 23 de junho, e instigou, no Rio de Janeiro, a prisão preventiva de 19 ativistas, um dia antes do último jogo da Copa, diante da iminência da ocorrência de manifestações.
A associação política foi acompanhada de um ajuste tácito em torno dos potenciais benefícios econômicos da Copa, fazendo com que vários meios de comunicação, que antes davam destaque aos problemas na preparação para a Copa, com a proximidade do evento, passassem a retirar esses questionamentos do noticiário como se nunca tivessem ocorrido.
4. “Rola a bola”
E quando rolou a bola a fantasia rolou solta. A cada chute, a cada drible, a cada gol, a cada virada, mídia e governo exaltavam a beleza da “Copa das Copas”... E como os estádios ficaram prontos, os aeroportos não ficaram entulhados, as manifestações foram abafadas e se esqueceram os problemas que envolveram a preparação para o evento, foi o momento de atacar os “pessimistas”, afirmando-se que os críticos que tinham feito apostas contra a capacidade do Brasil de organizar um evento dessa envergadura tinham perdido.
Verdade que muitas das premonições contra a Copa, como as que diziam respeito às deficiências de infra-estrutura, eram mesmo exageradas, embora não de todo despropositadas, vez que muitas obras foram concluídas no último instante e tantas outras sequer foram acabadas. De todo modo, problemas na preparação para a Copa existiram e mesmo que ainda estivessem produzindo efeitos concretos, sobretudo no que tange à exceção do Estado Constitucional, a fantasia criada em torno do evento buscava fazer com que os problemas fossem transformados em abstrações de conspiradores, vez que, em concreto, o que se via – como se queria ver – eram torcedores, de várias nacionalidades, entrando e saindo felizes dos estádios, deliciando-se com jogos emocionantes.
5. “Água de benzê, linha de passe e chimarrão”
E a seleção brasileira? Bem, a seleção brasileira foi a representação perfeita dos perigos de tentar viver no mundo da fantasia e dos efeitos deletérios da perda da racionalidade humana.
Transportando para a Copa do Mundo a fantasia da Copa das Confederações, os jogadores da seleção brasileira entraram em campo no primeiro jogo assumindo o papel de “salvadores da pátria”, da pátria com chuteiras. E dá-lhe hino a capella!
Convencidos pela força midiática de que eram super heróis, super craques e símbolos máximos do sucesso econômico do futebol, entoados por uma forte emoção social e carregados do peso insuportável de sufocar os problemas do país, os jogadores se viram na contingência de se encontrarem com seus limites humanos e viram abaladas as suas próprias forças e habilidades.
A seleção, que já possuía, no conjunto, limitações técnicas e deficiência tática, experimentou ainda maiores dificuldades e jogou mal o primeiro jogo, embora tenha vencido.
Mas, claro, a fantasia continuou imperando e foi como se o jogo não tivesse ocorrido. “Tocou Neymar é gol!”
A empolgação com a seleção continuou sendo fortemente incentivada pela grande mídia, exceção feita – nos limites do que tive a possibilidade de ver e ouvir – aos profissionais da ESPN.
No segundo jogo, outro susto. Empate com o México e a seleção novamente não se viu bem. No entanto, comissão técnica e jogadores pareciam estar em um universo paralelo. Para eles, tudo estava sob controle...
Depois, vitória sobre Camarões!!! E na visão fantasiada a seleção tinha encontrado o rumo definitivo dos bons resultados.
Os três jogos já demonstravam claramente que a seleção não estava bem e que corria muitos riscos no jogo contra o Chile. Mas os prognósticos eram: o Brasil passa, com certeza.
Passou, mas por muita, muita sorte, além, é claro, por conta da incompetência dos atacantes do Chile e bastante em razão da habilidade do goleiro Júlio César em pegar pênaltis.
Naquele instante já era possível vislumbrar a situação da seleção brasileira como a daquele time que no campeonato brasileiro fica quase todas as rodadas na zona de rebaixamento e que, faltando poucas rodadas para o término da competição, ainda tem chances matemáticas de não ser rebaixado, bastando para tanto que conquiste 12 nos últimos 15 pontos em disputa. Ora, ainda que matematicamente isso seja possível, não é muito razoável supor que um time que tem, por exemplo, cinco vitórias em todo o campeonato possa vencer quatro adversários nos últimos cinco jogos.
Os analistas profissionais da ESPN, por isso mesmo, continuavam fazendo suas advertências quanto à fragilidade coletiva e tática da seleção brasileira, mas no império do mundo da fantasia eram tachados de negativistas. O Brasil estava jogando mal e não era razoável supor que passasse a jogar bem de uma hora para outra, ainda mais porque entre os convocados não havia quem pudesse ser utilizado para mudar, radicalmente, a forma de jogar, que continuava sendo, “tocou Neymar é gol”.
Foi então que a fantasia da Copa se aliou à realidade totalitária e alguns jornalistas críticos da seleção foram chamados para uma conversa privada, na qual se tentou convencê-los de que não era conveniente que continuassem expressando suas compreensões. A reunião, segundo se relatou, foi amistosa e, em concreto, não repercutiu na postura dos jornalistas. De todo modo, ocorreu e só isso demonstra o quanto o mundo da fantasia se incomoda com racionalidades.
O jogo contra o Chile foi o fundo do poço e a forma como os jogadores desabaram ao final da partida impunha que a comissão técnica reconhecesse o exagero de todo o artificialismo em que a seleção estava envolvida.
Quando se esperava que um pouco de racionalidade fosse produzida, nova fantasia foi criada para manter a euforia em torno da seleção e blindar a comissão técnica: tudo não passava de problemas emocionais; nada que um trabalho psicológico de dois dias não resolvesse.
Com a vitória sobre a Colômbia por 2 a 1 a fantasia se consagrou de vez. A euforia não permitiu que se percebesse, no entanto, o quanto a Colômbia, naquele jogo específico, deixou a desejar.
Mesmo a perda trágica do Neymar, por contusão, do ponto de vista do efeito na seleção, foi minimizada, sendo transformada, por nova fantasia, em alimento para uma comoção social e para a extração de mais energia dos demais jogadores.
Em paralelo, a morte de duas pessoas e o ferimento de outras vinte e três no dia 03 de julho, um dia antes do jogo contra a Colômbia, em Belo Horizonte, decorrentes do desabamento de um viaduto, obra inacabada que seria destinada à mobilidade para a Copa, financiada pelo PAC da Copa, sob a responsabilidade do governo municipal e realizada por grandes empreiteiras, algumas já envolvidas em questões ligadas à falta de segurança dos trabalhadores, como atesta ação civil pública movida pelo Ministério Público do Trabalho na Bahia (Vara do Trabalho de Ipiaú)[3], foram igualmente conduzidos ao plano da abstração, não atingindo a comoção social devida (bem ao contrário do que se deu com a contusão do Neymar, que foi, por certo, muito triste), até porque não era o momento de expor questionamentos que pudessem abalar a performance da seleção em campo. A realidade dos problemas da preparação para a Copa se fazia presente, mas em nome da fantasia era desconsiderada.
6. “Não tem, vai pão com pão”
No plano do futebol, até então, concretamente, a seleção brasileira não havida jogado nenhuma partida de forma convincente e sem Neymar findou-se a única tática existente do “tocou Neymar é gol”. Além disso, sem Thiago Silva a “melhor defesa do mundo” já não seria igual. Era fácil saber, portanto, que o jogo contra a Alemanha seria uma parada duríssima e que o prognóstico mais próximo da realidade era o da derrota da seleção brasileira. Claro que no futebol tudo é possível, mas mesmo o imponderável tem limites e o jogo, de fato, se resolve em campo pela somatória de atuações e a estratégia utilizada. Não basta empolgação, raça ou força de vontade. Mas na fantasia alimentada a seleção era a melhor do mundo e seria ainda melhor sem o Neymar porque os demais jogadores, mesmo extenuados por terem tido que jogar carregando 200 milhões de brasileiros nas costas e por terem tido que fazer valer os compromissos comerciais assumidos pela CBF, jogariam pelo Neymar...
A comissão técnica não apenas foi envolvida neste clima como o incentivou. Ora, na qualidade de uma “comissão técnica” cumpria-lhe ter tido a percepção de que a situação punha a seleção brasileira em uma condição de inferioridade frente à seleção alemã. Mas não, mesmo tendo colocado em campo um “catado” que nunca havia atuado junto, armou a seleção indo para cima dos alemães, que jogam juntos há vários anos não só na seleção mas no próprio campeonato alemão, e mesmo levando um gol aos dez minutos, quando já era possível prever uma goleada, manteve a mesma forma de jogar: desesperada no ataque e atabalhoada na defesa.
Dir-se-á: agora é fácil falar! A questão é que a fantasia em que todos estavam envolvidos não permitia que a totalidade da situação fosse examinada, até porque naquela altura os interesses políticos e econômicos já se davam por satisfeitos e mesmo a derrota poderia ser alimento para novas fantasias...
Aliás, antes da partida contra a Alemanha foi sentenciado: independente do resultado do jogo, “o Brasil já se sente vitorioso!”
7. “Rabada com angu”
Só que a fantasia do futebol de tanto ser utilizada se vingou e resolveu trazer a realidade à tona: Alemanha 7, Brasil 1.
Em concreto, a soberba, a deficiência técnica, a falta de organização e o excessivo envolvimento do futebol com política e relações comerciais acabaram por expor a seleção brasileira a um vexame histórico, mas que acabou sendo necessário, pois somente uma hecatombe poderia extrair o Brasil do local mais profundo da irracionalidade em que se encontrava.
A goleada de 7 a 1 traduziu, exatamente, a distância na preparação que separava as duas seleções.
Na preparação, enquanto a seleção brasileira sofreu das conseqüências do artificialismo, incluindo a infantilização a que foram submetidos os jogadores, que serviram, também, todo o tempo, como garotos-propaganda de algumas marcas e de uma rede de televisão, a Alemanha se postou como uma seleção focada a um objetivo específico: jogar bola.
Naquele instante a análise já seria bastante óbvia, sem possibilidades de digressões. A fragilidade da seleção brasileira ficou à mostra, assim como a superioridade técnica da Alemanha.
8. “Um som bordão bordando o som, dedão, violação”
Era hora, pois, de trazer os problemas à tona, assumi-los e pensar sobre eles. Mas após tanto tempo no mundo da fantasia não apenas ficou definhada a capacidade de raciocinar, como se perdeu mesmo a vergonha de ofender a inteligência alheia.
Depois do jogo cheguei a rascunhar um artigo com o título, “enfim a razão”, supondo que diante das obviedades extraídas da partida não se teria mais lugar para fantasias.
Qual não foi a surpresa quando a comissão técnica veio a público para dizer que a preparação da seleção não teve nenhum erro e que no jogo com a Alemanha o que aconteceu foi apenas um apagão de 06 minutos, tendo sido o resultado final fruto do inexplicável e do acaso...
Neste instante fui invadido de extrema perplexidade e me lembrei de uma conversa que tive no começo desse ano com alguns alunos na Faculdade, quando falávamos sobre o quanto 2014 submeteria a nossa condição humana a testes extremos, isso porque já se podia verificar uma escalada da irracionalidade sobre diversos assuntos e diante da Copa e das eleições tal situação tenderia a se aprofundar.
Mas não foi só. Também o governo que se valeu da seleção e da Copa para abafar as mobilizações populares, passou a adotar uma postura de se desvincular do futebol, destacando apenas o seu papel de organizador do evento. Mas, para não perder a oportunidade de criar nova fantasia, exaltou a capacidade do povo brasileiro de superar a derrota: "Ser capaz de superar a derrota, eu acho que é a característica e marca de uma grande seleção e de um grande país", disse a Presidenta, deixando a entender que as ausências de Neymar e Thiago Silva foram os fatores determinantes da derrota[4].
E, deslocando-se, plenamente, do resultado, preconizou que a Copa foi uma "das melhores" já realizadas, "e isso é em grande parte devido à capacidade do povo brasileiro para oferecer hospitalidade e receber bem torcedores  de todo o mundo"[5].
Ou seja, mesmo com o histórico 7 a 1, o que se verificou foi a produção de novas irracionalidades, desenvolvidas no mundo da fantasia, para gerar a sensação de que a goleada simplesmente não havia ocorrido ou que não estivesse ligada a algum problema na formação, preparação e treinamento da seleção.
9. “Naco de peru”
Convencida da própria versão e com o alimento retórico de "Dona Lúcia", a comissão técnica, que não viu nenhum erro na atuação do Brasil e que foi prestigiada pela CBF, muito rapidamente recuperou o “alto astral”. Foi para o jogo contra a Holanda como se estivesse indo para uma festa cívica, alimentada por novas fantasias, como a de reintegrar o Neymar à delegação e até conduzi-lo ao banco de reservas, para atrair a simpatia do público.
Assim, a seleção brasileira entrou em campo contra a Holanda como se nada tivesse ocorrido e mesmo a torcida foi induzida a acreditar que as coisas voltariam à normalidade artificialmente construída, recuperando a esperança em torno da realização de uma partida técnica e plasticamente perfeita da seleção.
No entanto, conforme já denunciava o 7 a 1, a realidade era a de que seleção brasileira, independente da qualidade individual e da dedicação dos jogadores, no conjunto estava mal.
E a fantasia do futebol se rebelou novamente: 3 a 0.
10. “Sereno e pé no chão”
Com 10 a 1 na conta (somados os dois jogos) não é mais possível deixar de reconhecer que a própria fantasia está exigindo que se recobre a razão a partir de postulados da realidade e é preciso que isso se faça urgentemente, ainda que de forma serena, com pé no chão.
Por conta da derrota no futebol, não me parece devido fazer divagações acerca do caráter nacional, ou coisa que o valha, fazendo alusões a um suposto “complexo de vira-lata”. Talvez o mais apropriado seja tentar identificar os problemas das entidades responsáveis pela organização do futebol, que atingem outras instituições brasileiras, e para tanto cumpre dar destaque à leitura sociológica que aponta os efeitos negativos da ausência de uma revolução social. Lembre-se que sequer uma revolução burguesa em sua forma clássica se produziu entre nós, conferindo-nos um capitalismo dependente, que nega a existência da sociedade de classes e que está envolto em formas de conciliação com o passado[6], gerando um legado de preservação e acúmulo de lógicas escravistas, oligárquicas e anti-democráticas, além de práticas de corolenismo, clientelismo e fisiologismo. Essa situação, aliás, teria conferido um caráter autocrático à burguesia brasileira e o apego a um liberalismo dissimulado, que se vale da estrutura repressiva de poder para manter as desigualdades e impor submissão e acomodamento diante das adversidades à classe dominada, à qual se apresenta apenas o refúgio e a retórica de identidade, assim como a “liberdade”, nos eventos festivas[7], também como forma de abafar as tragédias cotidianas.
Isso não quer dizer que o povo tenha assistido a tudo bestializado[8] ou também que não tenham havido no Brasil inúmeras lutas sociais, sobretudo no âmbito da classe trabalhadora, o que é suficiente, inclusive, para negar a suposta apatia do povo brasileiro, mas não a alienação, obviamente, que é típica no capitalismo. Essas lutas, ademais, têm se intensificado nos últimos anos, sobretudo a partir de junho do ano passado, fazendo com que, neste aspecto, o Brasil esteja bem melhor que a seleção.
Fato é que não dá para continuar vivendo na fantasia. Mas mesmo com o 10 a 1 sair dela não é um passo muito simples, como se possa supor. Após o 10 a 1, o indignado Mauro Cezar Pereira desabafou: “agora só falta alguém dizer que a campanha do Brasil foi a melhor desde 2002”. E como ressaltou o próprio jornalista em questão: “e não é que o Felipão disse isso!”
Essa forma de análise, que nega os fatos, é uma agressão à inteligência de todos e serve para, mais uma vez, mascarar a realidade, fazendo pouco caso da vida em si. Ora, a seleção brasileira, seguramente, embora tenha passado por Chile e Colômbia, teve uma das piores performances entre todas as equipes do campeonato, tendo batido várias marcas negativas...
E cabe aqui uma advertência, que considero muito importante: tratar do assunto Copa e da performance da seleção brasileira exige o cuidado de não se deixar reconduzir ao mundo da fantasia, ainda que se esteja buscando uma racionalidade interna.
Assim, o primeiro passo que se deve dar para sair das amarras da fantasia é devolver o futebol ao limite de sua importância. Não é mais possível sustentar uma nação sobre a fantasia do futebol. Futebol é bom e a gente gosta, como se dá, ademais, em diversos outros países, não sendo, pois, um privilégio, para o bem e para o mal, do Brasil. Mas essa história de que o Brasil é o país do futebol é um estereótipo que nega a sua própria razão de ser como nação. Aliás, a diversidade de nações, visualizadas em posições contrapostas, é um elemento cultural, político e econômico a ser superado.
É importante perceber, também, o quanto o futebol se tornou uma fonte de sustento do modelo capitalista, produzindo riquezas para alguns poucos e entretenimento entorpecente para tantos outros.
Claro que não se pode desprezar a força do futebol, até porque o resultado positivo em campo acaba sendo utilizado para reforçar fetiches e mascarar os problemas sociais, assim como o resultado negativo na Copa pode servir como alimento para superar os obstáculos ao raciocínio, somando-se, ainda, o quanto a postura política dos jogadores pode auxiliar nas mobilizações sociais, como se deu com o jogador Sócrates na campanha pela democratização do país.
11. “É sola, esfola, cola, é pau a pau”
No presente momento é de suma importância ter a capacidade de se afastar da fantasia da Copa. Temos, agora, a grande oportunidade de voltar à realidade na busca de, enfim, construir uma sociedade efetivamente justa.
Claro que o péssimo resultado futebolístico na Copa, que reflete problemas estruturais, impõe que se pense nas necessárias mudanças no futebol, que envolvem, também, o reconhecimento dos direitos dos atletas, a superação da lógica autoritária dos clubes, a fixação de uma concreta responsabilidade fiscal no setor, o respeito aos direitos dos consumidores etc. Mas o assunto principal que nos deve impulsionar neste momento não é este. Principalmente, não devemos nos limitar a esse debate, vez que isso apenas nos condenaria a viver na fantasia, alastrando-a até a outra Copa daqui a quatro anos.
Reitero: são importantes as reivindicações do Bom Senso Futebol Clube quanto aos direitos dos jogadores e à democratização da administração do futebol e é mesmo relevante a postura do Estado em estimular as práticas atléticas, tanto no futebol quanto em outros esportes. Mas essa não pode ser a prioridade brasileira neste instante. Ou, pelo menos não deve ser a única preocupação.
Ultrapassado o grande risco da supressão plena da racionalidade que o período da Copa representou, a prioridade agora só pode ser a do esforço concentrado – que o país tem condições de assumir, como se viu, afinal, no momento de preparação para a Copa – em torno da efetivação dos direitos sociais, sobretudo no que se refere à moradia, à educação pública e gratuita de qualidade, à saúde pública, ao transporte gratuito para todos, ao trabalho digno, ao acesso à cultura, acompanhada de uma política concreta de melhor distribuição da riqueza produzida e da ampliação e concretização das práticas democráticas, notadamente no que se refere à participação nos entes deliberativos e às formas públicas de reivindicação.
É preciso, além disso, ficar muito atento, pois neste período pós Copa há também o grande risco de se tentar manter a sociedade envolvida com as artificialidades da Copa, que podem até gerar novos gastos para a promoção de outros grandes eventos nos estádios que foram construídos exatamente para não incorrer na crítica da ausência de um legado com os estádios, dificultando e atrasando ainda mais a obra em torno daquilo que prioritariamente deve interessar à sociedade brasileira.
É emergencial, sobretudo, retomar a vigência do Estado Democrático de Direito, a começar pela libertação de todos os presos políticos, que foram conduzidos a tal situação durante o Estado de Exceção da Copa, valendo lembrar que o legado autoritário de 21 anos de ditadura ainda está estruturado em muitas de nossas instituições.
É essencial, também, reparar os danos já gerados a vários cidadãos brasileiros no período da preparação para a Copa, especialmente no que se refere às famílias removidas; às vítimas dos acidentes do trabalho e da pressão na execução das obras; aos trabalhadores ambulantes etc.
Aos trabalhadores em geral, enfim, cumpre que não permitir que se promova um aprofundamento dos erros já iniciados no momento de preparação para a Copa, sobretudo no que tange às deteriorações das condições de trabalho (com pressão para a realização dos serviços e intensificação do trabalho em horas extras), à negação ao direito de greve e ao incentivo à terceirização.
Nunca é demais lembrar que o governo federal, ao se ver envolvido com o desafio de organizar a Copa, acabou por se associar à FIFA (e suas parceiras econômicas) e como condição para a realização do evento se viu na contingência de patrocinar uma excepcionalidade na ordem jurídica constitucional, sobretudo em favor de alguns segmentos do setor econômico, do que se originou, inclusive, a malfadada “Lei Geral da Copa”.
Para a construção dos estádios em tempo recorde fez-se vista grossa à forma de atuação de empreiteiras no processo produtivo. Essa situação provocou um retrocesso na luta que vinha sendo travada contra a terceirização na construção civil, sendo bastante oportuno lembrar que as empreiteiras são grandes financiadoras de campanhas eleitorais, de diversos partidos políticos[9].
Essa aproximação do governo com o setor econômico gerou uma conta, que está sendo paga com a adoção de uma política repressiva, institucional e midiaticamente organizada, contra o direito de greve, sendo seguida do anúncio de medidas de precarização das relações de trabalho, como forma de favorecer ao novo ciclo da “competitividade produtiva”, conforme anunciou a Presidenta Dilma[10].
Na linha das iniciativas precarizantes projetam-se a ampliação da terceirização e o incentivo à negociação coletiva, além da instituição de formas não estatais de solução dos conflitos trabalhistas. É possível verificar esse direcionamento no Projeto de Lei recentemente apresentado pelo governo, que visa à criação do SUT – Sistema Único do Trabalho, no qual as figuras em questão ganham destaque.
No que tange à terceirização especificamente, o governo, diante da pressão sofrida pelo meio sindical, deixou de lado a defesa que vinha fazendo abertamente do Projeto de Lei. 4.330, que ampliava a terceirização, tendo sido a questão encampada pelo Supremo Tribunal Federal, que reconheceu, no Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 713211, a repercussão geral de um julgamento que envolve a definição acerca da amplitude jurídica do fenômeno econômico da terceirização.
Os trabalhadores, a Justiça do Trabalho e os defensores dos direitos dos trabalhadores em geral devem perceber o contexto de retração de direitos que foi iniciado no período de preparação para a Copa, que se reforçou durante o evento e que tende a se consolidar e até a se ampliar no momento posterior, que, ademais, está atrelado à preparação para as Olimpíadas de 2016. E já adiantando um debate necessário a respeito das Olimpíadas, cumpre registrar que após vários anos da definição de que o Brasil sediaria o evento, não se implementou uma política efetiva de formação de atletas, sendo os jovens brasileiros ainda conduzidos ao triste dilema entre estudar ou treinar, pois o esporte não está atrelado à educação, como se dá, por exemplo, nos Estados Unidos.
Voltando ao aspecto dos direitos trabalhistas, cumpre reconhecer que a triste realidade dos trabalhadores no Brasil não é uma novidade ou mesmo uma exclusividade determinada pela Copa, até porque o histórico brasileiro é o do desrespeito reiterado aos direitos trabalhistas e do massacre cultural à relevância desses direitos. Mas as circunstâncias atuais são preocupantes, visto que o entorpecimento favorecido pela Copa e pela proximidade das eleições tende a dificultar as compreensões sobre o fenômeno da precarização, obstando as ações de resistência.
Cumpre destacar que em infeliz coincidência, a precariedade das relações de trabalho conduziu o Brasil a outro quarto lugar. Esse quarto lugar, no entanto, envergonha muito mais do que o da Copa. De fato, o Brasil tornou-se o quarto país do mundo em número de acidentes fatais no trabalho[11].
Interessante que os trabalhadores mais suscetíveis a acidentes são os motoristas, os agentes de segurança, os trabalhadores da construção civil e os trabalhadores rurais e as reformas jurídicas que estão sendo preconizadas direcionam-se, exatamente, para reforçar a precariedade nestes setores.
A terceirização é utilizada em larga escala nos serviços de segurança, na construção civil e no transporte e “segundo dados do Dieese, o risco de um empregado terceirizado morrer em decorrência de um acidente de trabalho é cinco vezes maior do que nos demais segmentos produtivos”[12]. A ampliação vislumbrada, ademais, faz supor que também o meio rural será atingido por uma terceirização mais intensa, valendo acrescentar que no meio rural a atuação da fiscalização do trabalho é bem menos efetiva.
Por oportuno, lembre-se que também tramita no Congresso Nacional um projeto de lei para revogar a lei que limitou a jornada de trabalho dos motoristas.
Outra conta cobrada pelo setor econômico foi a suspensão, já autorizada pelo Ministério do Trabalho, da aplicação da NR12, que regulamenta a forma das atividades produtivas com máquinas. Só que em 2013, “apenas 11 tipos de máquinas e equipamentos (como serras, prensas, tornos, frezadoras, laminadoras, calandras, máquina de embalar) provocaram 55.118 infortúnios, o que representa mais de 10% do total de 546.014 acidentes típicos comunicados pelas empresas no Brasil”[13].
Essa tendência de precarização não é fantasia e caso se consolide anula por completo qualquer efeito benéfico que se queira vislumbrar com a realização da Copa, ainda mais quando se lembra de todos os problemas havidos na preparação para o evento. A situação é concreta e sem o entorpecente da Copa não se a pode eliminar com artificialismos retóricos. Assim, a única forma concreta para que o governo do Partido dos Trabalhadores não se veja relacionado a ela é vir a público rechaçá-la, assumindo uma política de rejeição a todas as formas de redução dos direitos trabalhistas e de repressão à mobilização de classe dos trabalhadores, indo, aliás, em sentido inverso, implementando as condições materiais necessárias para uma atuação efetiva da fiscalização do trabalho e impulsionando a adoção de novas formas jurídicas de proteção aos trabalhadores, notabilizando-se a co-gestão de empresas por seus empregados e a proibição de dispensas socialmente injustificadas, para falar de dois exemplos extraídos da realidade alemã.
O que não dá é que:
“...fique na banheira, ou jogue pra torcida
Feliz da vida!”





(*) Professor livre-docente da Faculdade de Direito da USP.
[1]. Os subtítulos foram extraídos da belíssima música, Linha de Passe, de João Bosco e Aldir Blanc, de 1979, como forma de prestar uma homenagem aos protagonistas do programa Linha de Passe da ESPN Brasil, por terem trazido racionalidade ao obscurantismo da Copa, e também para lembrar que o Brasil é bem mais que futebol.
[3]. http://www.bahianoticias.com.br/noticia/157170-empresas-responsaveis-por-viaduto-que-desabou-em-bh-participam-de-obras-de-ferrovia-na-bahia.html
[4]. http://g1.globo.com/politica/noticia/2014/07/dilma-diz-que-brasil-vai-superar-dor-relata-jornalista-da-cnn-no-twitter.html
[5]. http://g1.globo.com/politica/noticia/2014/07/dilma-diz-que-brasil-vai-superar-dor-relata-jornalista-da-cnn-no-twitter.html
[6]. FERNANDES, Florestan. A revolução burguesa no Brasil: ensaios de interpretação sociológica. São Paulo: Ed. Globo, 2006.
[7]. CARVALHO, José Murilo de. Os bestializados: o Rio de Janeiro e a República que não foi. São Paulo: Companhia das Letras, 2007.
[8]. CARVALHO, José Murilo de. Os bestializados: o Rio de Janeiro e a República que não foi. São Paulo: Companhia das Letras, 2007.
[9]. A empresa envolvida no desabamento do viaduto em Belo Horizonte, Construtora Cowan S/A, repassou R$ 2,8 milhões para campanhas eleições em 2012, ocupando a 73ª posição em relação às empresas que mais doaram para campanhas eleitorais naquele ano. A lista de doações é liderada pela Andrade Gutierrez (R$ 81,2 milhões), Queiroz Galvão (R$ 52,1 milhões) e OAS S.A. (R$ 44,1 milhões). http://www.contasabertas.com.br/website/arquivos/8943#sthash.qpqYf2fw.dpuf.
[11]. http://www.conjur.com.br/2014-jul-04/brasil-quarto-pais-numero-acidentes-fatais-trabalho
[12]. http://www.conjur.com.br/2014-jul-04/brasil-quarto-pais-numero-acidentes-fatais-trabalho
[13]. Cf. Alessandro da Silva e Vitor Araújo Filgueiras, in: http://reporterbrasil.org.br/2014/07/mais-de-55-mil-trabalhadores-sofreram-acidentes-com-maquinas-em-2013/

domingo, 13 de julho de 2014

Nota de Repúdio às Prisões Arbitrárias




A essas alturas, em face do que ocorreu no Rio de Janeiro ontem, não adianta muito desabafar: eu não disse!?
O que se deve fazer é cerrar fileiras na luta pelo retorno do Estado Democrático de Direito, o que se dará apenas com a libertação imediata de todos os presos políticos, que foram conduzidos a tal situação durante o Estado de Exceção da Copa.
Não havendo muito mais o que dizer a respeito, dada a obviedade da situação, e como já venho me manifestando a respeito há meses, cumpre, agora, dar a palavra a outros interlocutores, conforme segue:

"NOTA DE REPÚDIO ÀS PRISÕES ARBITRÁRIAS

Na véspera da final da Copa do Mundo, o principal debate não é sobre quem será o possível campeão, mas sim sobre se temos ou não democracia em nosso país. A Justiça expediu 26 mandados de prisão contra professores, jornalistas, radialistas, midiativistas e outros cidadãos, além de mandados de apreensão de dois adolescentes, por conta da participação destes em manifestações e da articulação de novos protestos para os próximos dias. O ato repete prisões que ocorreram também na abertura da Copa.

Tal atitude nos afasta cada vez mais de um Estado Democrático onde o direito à liberdade de expressão e manifestação deve ser garantido amplamente. Por conta disso, as entidades e militantes abaixo assinados repudiam a ação policial e fazem questão de frisar algumas questões relevantes:

1 — O advogado criminalista Lucas Sada, do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Município do Rio de Janeiro, cuida do caso da radialista Joseane de Freitas, da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), presa neste sábado (12/07) sob a alegação de formação de quadrilha armada, assim como todos os outros presos. O advogado relatou que Joseane apenas participou de duas manifestações, a mais recente realizada em Copacabana por ocasião da abertura da Copa do Mundo. Ela e os outros presos no Rio serão encaminhados ao Complexo Penitenciário de Gericinó, em Bangu. Este fato reforça características típicas de Estado de exceção que estamos enfrentando nos últimos dias.

2 — A Polícia permitiu acesso exclusivo para os jornalistas a serviço da mídia corporativa empresarial, impedindo jornalistas e comunicadores independentes de fazerem a cobertura da ação. Esse fato revela uma atitude antidemocrática e fere a liberdade de expressão e de imprensa, caracterizando uma violação aos direitos humanos.

3 — Outra violação de Direitos quase se concretizou com a autorização para que os jornalistas que tiveram acesso às dependências da Cidade da Polícia filmassem e fotografassem os presos políticos, mesmo sem haver nenhuma condenação aos suspeitos. Sem maiores explicações, a polícia desistiu de apresentar os detidos. Repudiamos a imposição desse tipo de tarefa pelas empresas aos jornalistas, que viola o Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros. Tal repúdio se dá porque a atitude da polícia e também das empresas que em outros casos já publicaram imagens se impõe como uma violação aos Direitos Humanos dos presos políticos, e um ataque à Cláusula de Consciência do mesmo Código, que garante o direito de os profissionais se negarem a tarefas antiéticas.

4 — Ao chegar à Cidade da Polícia para verificar denuncia de cerceamento ao trabalho dos jornalistas, a diretora do sindicato Gizele Martins foi impedida de ter acesso às dependências da delegacia. Do lado de fora, ela comprovou que jornalistas independentes e comunicadores foram de fato proibidos de entrar na unidade.
Diante desse cenário, é necessário restabelecermos o Estado Democrático de Direito com garantia da liberdade de expressão, manifestação e imprensa. Não podemos admitir, a pretexto da garantia da ordem, o cerceamento de direitos e a prisão daqueles que participam de protestos e lutam por suas causas, ideais e sonhos de uma sociedade mais justa, livre e democrática."

Assinam:

Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Município do Rio de Janeiro
Sindicato dos Radialistas do Estado do Rio de Janeiro
Associação Mundial de Rádios Comunitárias